transcrito da edição 203 da Revista RI - Relações com Investidores
Como arrombar um caixa
estatal sem explosivos
Luiz Fernando Rudge
A União deve – e não paga – uma explicação ao
Brasil sobre como a direção de uma companhia estatal apresenta furos de
controle, inspeção e fiscalização como os que ocorreram com a Petrobrás, entre
2004 e 2012, período em que o caixa foi literalmente arrombado por uma
quadrilha de diretores e gerentes da companhia, e validados em atos societários
públicos pelo acionista controlador, que é ela mesmo, a União.
Os prejuízos diretos desses assaltos ficam
para as centenas de milhares de acionistas e milhões de cotistas de fundos de
pensão e de investimento, no Brasil e no resto do mundo.
Os prejuízos indiretos ficam para todo o povo
do país.
Os danos à imagem da Nação não têm medida de
comparação.
Do faturamento ao pagamento e, no final, às
Demonstrações Contábeis, os contratos envolvem todas as assembleias, diretorias,
gerências, Conselho, comitês, instituições e repartições, centrais de negociação
e fiscalização, nacional e no Exterior, que estão demonstradas no Infográfico que acompanha este texto.
Ninguém viu, ninguém conferiu, ninguém fiscalizou, ninguém impediu, por
alguns anos, até que o rombo no caixa da Petrobrás chegasse aos níveis acusados
nas Demonstrações Financeiras expostas em 24 de abril do ano passado, com R$ 6,194
bilhões declarados de propinas pagas e R$ 44,3 bilhões de impairment (perda no valor de
recuperação de ativos), valor este
estimado, em janeiro de 2015, em R$ 88,6 bilhões pela presidente Graça Foster.
Em sua mensagem no Relatório de Administração referente a 2015, o
presidente Aldemir Bentine diz que “nosso resultado foi
notadamente impactado pela queda do preço da commodity e pela desvalorização
cambial. Mas ressalto que, sob a ótica de caixa, nossa geração operacional
superou os investimentos, invertendo os recentes resultados negativos e
ajudando na elevação do nosso caixa e na redução da dívida líquida”.
Não faz qualquer
menção aos fatos relatados na reunião que divulgou o balanço de 24 de abril,
que só aparecem mesmo nas Notas Explicativas das Demonstrações Financeiras do
ano.
onde começou a ação
Muitas vezes se
repete um histórico de corrupção envolvendo as empresas estatais brasileiras.
Mas, o assalto ao caixa da Petrobrás assume proporções que ficarão na história
das fraudes empresariais em todo o mundo, em todas as épocas.
Uma das primeiras
cenas desta tragédia ambienta-se em uma reunião em Caracas, onde Lula e Hugo
Chavez combinam construir uma refinaria em Pernambuco, com investimento
conjunto de 2,5 bilhões de dólares, onde Chavez entraria com 40%, para refinar
óleo pesado da Venezuela. Anos depois, já com a conta da obra ultrapassando os 18
bilhões de dólares, descobre-se que a “combinação” não estava traduzida num
contrato formal. A Petrobrás cobra o governo venezuelano em 40% do valor gasto,
e Chavez não cumpre a sua parte – seria um irresponsável se o fizesse, em face
do aumento nos custos. Resultado: a Petrobrás assume sozinha o empreendimento e
tem que modificar o projeto para refinar outros tipos de petróleo.
Surgem mais duas
refinarias (Premium I e II), no Maranhão e no Ceará, ambas com obras suspensas
depois de gastos alguns bilhões de reais nelas. E um complexo petroquímico com
refinaria em Itaboraí é provisoriamente suspenso, por causa dos desvios de
verbas. Ao mesmo tempo, aparece o affaire
Pasadena, por demais conhecido para ser relembrado.
Nessas refinarias e
na Sete Brasil, empresa de investimentos criada em
2011 e especializada em gestão de
portfólio de ativos voltados para
a exploração na camada pré-sal, reside o fulcro das operações que
resultam no desvio de dinheiro da Petrobrás.
QUEM DEVE?
Diz o Relatório de
Administração de 2015 que foram feitos pagamentos indevidos a “partidos políticos, políticos eleitos ou
outros agentes políticos, empregados de empreiteiras e fornecedores, ex-executivos,
ex-empregados da Petrobras e outros envolvidos no esquema”.
O Relatório passa em
branco sobre as causas desses pagamentos indevidos, bem como não expõe como
foram furados seus sistemas de controle e fiscalização, inspetoria e auditoria.
E resguarda os
responsáveis funcionais pelo primeiro nível de decisão da Companhia, ou sejam o
seu acionista controlador (a União), representado constitucionalmente pelo
presidente da República, mais os presidentes do Conselho de Administração e da
Diretoria da companhia, e seu diretor financeiro, filtro final por onde passa –
ou deve passar - todo o dinheiro que entra ou sai da Petrobrás.
Para que não se
esqueçam dos nomes: Luiz Inácio Lula da Silva, Dilma Vana Rousseff, Guido
Mantega, José Sérgio Gabrielli, Graça Foster e Almir Barbassa.
LUIZ FERNANDO RUDGE
é
consultor financeiro, foi editor de Economia e Finanças do jornal Folha de S.
Paulo e do jornal “Investimento”, da Gazeta Mercantil, e autor de livros sobre
mercado financeiro, mercado do ouro e dicionário de finanças. rudge@enfin.com.br